Recentemente, em uma quinta-feira, dezenas de imigrantes latinos se reuniam em um pequeno e barulhento escritório no segundo andar de um prédio em Nova York, esperando que um dos atendentes especializados em empréstimos chamassem seus nomes e entregassem o cheque. Crianças brincavam nas escadas ou se deitavam esparramadas no colo das mães.
Os empréstimos eram registrados à moda antiga: com tinta, em cadernetas bancárias verdes que citavam os compromissos dos clientes em "exercer o comportamento financeiro responsável", "procurar atendimento médico preventivo" e se encontrar toda semana em um "local seguro e confortável". Tirando essas palavras, pouca coisa garantia os empréstimos em questão, que variavam entre US$ 1.500 (R$ 3.800) e US$ 8 mil (R$ 18,57).
Essa forma de microcrédito — o menor dos pequenos empréstimos, sem garantias e questões em demasia — teve como pioneiro o banco Grameen, em Bangladesh, e sempre teve como objetivo reduzir a pobreza nos países em desenvolvimento, onde os pequenos produtores rurais o utilizam para comprar animais, consertar motocicletas ou aumentar a renda de alguma outra forma. Desde a crise financeira, o microcrédito decolou nos Estados Unidos, atraindo milhares de clientes sem qualificação para cartão de crédito ou empréstimos bancários tradicionais.
O propósito dos empréstimos, tal como concebido por Muhammad Yunus, o fundador do banco Grameen e vencedor do prêmio Nobel, é ajudar milhões de pobres a liberar o empreendedor que trazem dentro de si, para "usar dinheiro para ganhar dinheiro", como ele afirmou durante entrevista telefônica. Contudo, sua nova popularidade pode dizer mais sobre a natureza cada vez mais instável da pobreza nos EUA, onde é difícil ter crédito e o sustento é garantido por empregos em meio período e ameaçado por despesas imprevisíveis.
"As famílias na África rural são mais parecidas com as famílias americanas do que as pessoas querem acreditar", afirma Jonathan J. Morduch, diretor-executivo da Iniciativa de Acesso Financeiro na Universidade de Nova York, que estudou o microcrédito e está examinando de perto as vidas financeiras dos americanos de renda baixa e moderada. "A desigualdade oculta nos Estados Unidos tem a ver com a segurança fundamental, a capacidade de planejar."
Nos EUA, o microcrédito em geral tem sido definido como empréstimos inferiores a US$ 50 mil (R$116 mil) para pessoas — na maioria empreendedores — que não conseguem, por diversos motivos, fazer empréstimos bancários. A maioria dos microcredores sem fins lucrativos oferece serviços como educação financeira e orientação ao plano de negócios, que contribuem ao custo de oferecer tais empréstimos, mas também asseguram tais grupos, auxiliam no sucesso de quem faz empréstimos.
O Grameen America dispensa a orientação e concede empréstimos menores e menos formais a um custo menor. Ele é mais parecido com o modelo desenvolvido em Bangladesh: em grupos de cinco, um interessado aprova o empréstimo do outro e faz pagamentos semanais com 15% de juros anuais, taxa comparável à cobrada por outros credores sem fins lucrativos. A cifra é muito inferior às taxas dos empréstimos consignados, que podem cobrar 400% ou mais.
Se todo mundo quitar o valor dentro do prazo, cada integrante tem direito a um empréstimo maior no próximo ciclo. Os membros devem estar abaixo da faixa de pobreza federal para participar e usar o dinheiro com propósito empreendedor. O Grameen não pergunta se são residentes legais.
Porém, com mais de 45 milhões de americanos vivendo abaixo da linha da pobreza, o Grameen mal tocou na superfície do problema. E é difícil dizer se o programa está conquistando o objetivo de levar pessoas à classe média.
Em Nova York, os tomadores de empréstimo disseram ter empregado o dinheiro para comprar bijuterias, suplementos nutricionais da Herbalife ou cosméticos da Mary Kay para revender em empreendimentos caseiros ou de porta a porta, com muitos suplementando a renda de outro emprego, como a de faxineiro.
Há quem prepare bolos ou empanadas. Outros fazem roupas ou vendem flores. Uma mulher compra roupas de grife em pontas de estoque e as revende em uma lojinha no segundo andar de um complexo comercial; outra envia roupas para a República Dominicana, onde a irmã as vende na rua.
Até mesmo quem tem lojas estabelecidas se voltou ao Grameen. Guadalupe Perez, 51 anos, fez um empréstimo quando os negócios caíram durante a recessão. Ela e o marido enfrentavam dificuldades para pagar o aluguel da loja de decoração para festas que abriram com a poupança.
"Foi uma maneira de manter minha empresa", diz ela, por meio de um intérprete, ao lado do mostruário de fitas e taças de vinho enfeitados com toques brilhantes. "Eu queria conhecer as regras do Grameen porque tinha medo de ir a um banco. Era um empréstimo que eu podia pagar pouco a pouco. Senti que era uma boa escolha para mim."
Existem poucos dados bons sobre os benefícios do microcrédito e os poucos estudos aleatórios não demonstraram que ele tenha melhorado substancialmente a prosperidade nos países em desenvolvimento. Nos EUA, os dados coletados pelo programa de campo do Instituto Aspen mostram que os microcréditos geram aumentos importantes na receita e criam empregos. Joyce Klein, diretora do programa, destaca que os levantamentos têm limitações e estudos mais rigorosos incluindo grupos de controle aleatórios seriam extremamente caros.
Segundo o Grameen, seus tomadores de empréstimos aumentaram a renda, em média, em US$ 2.500 durante cada ciclo semestral de empréstimo, e que um a cada cinco contrata um funcionário.
Porém, Katherine Rosenberg, vice-presidente sênior, admitiu que quantificar a renda é o maior desafio do grupo, pois os tomadores costumam pensar em termos de ter ou não o bastante para cobrir a próxima conta, não o faturamento geral. Rosenberg afirmou que muitos clientes podem não ganhar mais e, sim, trabalhar menos, abrindo mão de um entre vários empregos de baixo salário ou se aproveitar da flexibilidade de ser autônomo para passar mais tempo com os filhos.
Elizabeth de Jesus, 45 anos, é uma cabeleireira que com a ajuda do Grameen conquistou o sonho de abrir o próprio salão. No entanto, ela não consegue estimar a renda anual. "Não sei por que não consigo guardar. Gasto tudo em pagamentos, no aluguel, na comida. Eu o gasto toda semana."
O Grameen auxilia seus clientes de uma maneira que os especialistas consideram ser mais importante do que o aumento de renda, estabelecendo bons registros de crédito. Muitos grupos para a redução da pobreza mudaram o foco da poupança para a construção do crédito porque as pessoas com pouco ou nenhum crédito precisam deixar depósitos grandes para as necessidades básicas, como pagamento de água e luz, têm problemas ao alugar casas boas, pagar taxas de juros maiores e dificuldade maior em encontrar emprego.
Nayrobi Gonzalez de Quiroz, 26 anos, recebeu recentemente o primeiro empréstimo do Grameen, mas decidiu não seguir adiante com o plano de comprar bolsas femininas para revender. Depois de usar US$ 200 (R$ 464,32) para quitar uma dívida, ela achou mais seguro deixar o dinheiro no banco e fazer os pagamentos com os ganhos como manicure.
"Aqui é preciso ter crédito bom. Tenho um filho pequeno e preciso pensar em seu futuro."